Nestes tempos em que o papel do jornalismo tem sido colocado em xeque, iniciativas de news literacy — ou alfabetização jornalística, em tradução livre — procuram recuperar a confiança e a admiração das pessoas pela imprensa, desenvolvendo competências de avaliação de informações e estimulando a participação em ações em prol da democracia. É o caso do The News Literacy Project, uma organização educativa sem fins lucrativos dos Estados Unidos que trabalha com professores e veículos jornalísticos para que estudantes se tornem consumidores inteligentes e cidadãos engajados.

A vice-presidente de comunicações do The News Literacy Project, Christine Nyirjesy Bragale, é uma das convidadas do II Congresso Internacional de Comunicação e Educação. Ela participa do painel “Educação midiática e liberdade de expressão”, que acontece no dia 12 de novembro de 2018, na Escola de Comunicações e Artes da USP, em São Paulo (SP), a partir das 13h30. Nesta entrevista exclusiva à ABPEducom, ela fala sobre noções importantes da alfabetização jornalística, como a identificação dos diferentes tipos de informação e o engajamento cívico.

Bragale é jornalista internacional veterana e ex-membro do corpo de imprensa da Casa Branca. Ela cobriu política, diplomacia e notícias internacionais, além de ter trabalhado como produtora de televisão e editora. Também construiu uma carreira premiada na área de Relações Públicas e liderou a comunicação global e a equipe de engajamento público da organização humanitária Mercy Corps. Ela tem bacharelado em História e certificado em estudos latino-americanos pela Universidade de Georgetown.

ABPEducom: Quais são os diferenciais da alfabetização jornalística em comparação com outras iniciativas de educação midiática?

Christine Bragale: A alfabetização jornalística trata de ensinar às pessoas as habilidades de que elas precisam para se tornar consumidores inteligentes e engajados de notícias e informação. Por outro lado, a alfabetização midiática tem um foco maior na cultura popular e enfatiza questões de representação — por exemplo, como mulheres e pessoas negras são representadas no cinema e na televisão.

No The News Literacy Project, nós ensinamos estudantes a avaliar informações com base nos padrões de jornalismo de qualidade como ponto de partida e a classificar informações em categorias como publicidade, notícias, opinião, propaganda política. O objetivo aqui é entender o principal propósito dos diferentes tipos de informação — vender, informar, persuadir, incitar à ação. Então podemos tomar nossas próprias decisões sobre o que fazer com essa informação.

“Eu realmente acredito que possa haver mais visibilidade e educação sobre os padrões do jornalismo de qualidade” — Christine Bragale

Como o jornalismo pode ser relevante e útil na educação básica, especialmente no contexto da era digital atual, e quais pontes ainda precisam ser construídas ou fortalecidas entre eles?

Nós sabemos, por meio de um grande número de estudos nos Estados Unidos e em outros lugares, que as pessoas ao redor do mundo estão perdendo a confiança nos veículos jornalísticos e que seu apreço pelo papel de uma imprensa livre em uma democracia também está declinando. Não sei qual é a solução completa, mas eu realmente acredito que possa haver mais visibilidade e educação sobre os padrões do jornalismo de qualidade. É por isso que, no The News Literacy Project, nos esforçamos para explicar por meio de nosso currículo como os jornalistas fazem seu trabalho, muitas vezes sob condições difíceis e mesmo muito perigosas, e construir um apreço não apenas pelo jornalismo de qualidade, mas também pelo papel da imprensa como um cão de guarda.

Quais são as semelhanças e as particularidades dos desafios enfrentados pela educação midiática em geral, e especificamente pela alfabetização jornalística, nos EUA e na América Latina?

Estou menos familiarizada com os desafios específicos da América Latina. Mas acho que vemos desafios semelhantes em todo o mundo: grandes quantidades de informação para navegar; facilidade de compartilhar informações falsas; velocidade com que a informação viaja; falta de confiança pública na mídia tradicional.

O que o The News Literacy Project entende como “engajamento cívico” e até que ponto ele é contemplado pela alfabetização jornalística?

Engajamento cívico é a participação na vida da comunidade e do país de alguém. Isso pode se dar de muitas formas — desde apoiar iniciativas de reciclagem até advogar por melhor assistência médica e participar de ativismo político. É claro que a ação cívica mais importante é votar — e as eleições têm como premissa um eleitorado informado. Com habilidades ligadas à alfabetização jornalística, as pessoas sabem em quais informações confiar, quais compartilhar e sobre quais agir.

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